O Quarto de Jack, sonhos não se prendem em paredes

Sonhar só é impossível quando seu cativeiro é sua própria mente.

O Quarto de Jack é, sem dúvidas, o filme mais sensível de 2015, sua história é comovente, suas interpretações são intensas, tocantes e com uma carga dramática absurda. Não é um filme triste ou amargurado, o longa te cativa desde os 5 primeiros minutos até os últimos 5 minutos, não é apenas um “drama maternal” ou a história de um garoto de 5 anos que mora com a mãe dentro de um quarto com 10m², é muito mais que isso.

Jack (Jacob Tremblay) é um garoto de 5 anos de idade que mora em um cubículo de cômodo com a sua mãe, todo contato que ele tem com o mundo que na visão dele é o quarto onde vive restritamente são as coisas que estão à sua volta, sendo o seu melhor amigo a TV, onde passa a maior parte do tempo assistindo desenhos e programas que, para Jack, mesmos as coisas reais exibidas na tela são enxergadas como ficções, limitando o menino a uma vida de horas passadas em frente à televisão e brincadeiras simples com sua mãe.

o quarto de jack

Desde os primeiros minutos nos apaixonamos pela sensibilidade do olhar do Jack, um olhar curioso, tímido e sonhador, durante todo o filme Jack “grita” com os olhos, a sensibilidade que é passada através de seu olhar é impressionante, a maneira como seus olhos cintilam ao contemplar algo até então desconhecido e nunca “habitado”, um olhar explorador, porém travado e amedrontado, tornando, assim, um elemento de destaque e protagonista, sua maneira de admirar e observar o novo mundo diante dele é simplesmente incrível, como de um cego que é presenteado com a visão depois de anos sem a habilidade de contemplar o seu habitat.

Um ator tão novo, mas ele simplesmente te ganha do começo do filme até o final. Todas as cenas, desde os diálogos com sua mãe, ou sua narrativa a respeito do “Mundo” e dos sonhos, desejos, medos, inseguranças e ansiedades do pequeno Jack, até seu olhar de amor, carinho e dependência por sua mãe. Sem dúvidas uma das melhores atuações infantis que eu já vi.

Brie Larson, vencedora do Globo de Ouro como Melhor Atriz em Filme Dramático, desbancando a britânica amada e idolatrada, Cate Blanchett, ela realmente mereceu e arrisco dizer que ela  também é igualmente merecedora do Oscar de Melhor Atriz.

Muito pouco tinha se ouvido falar de Brie Larson, a maioria de seus trabalhos eram secundários e até “apagados” em certos filmes, como no filme Anjos da Lei, porém seu trabalho mais “conhecido” pelo público, foi em Scott Pilgrim contra o Mundo, onde fez a ex namorada do Scott. Muitos não devem ter dado muito crédito e atenção a essa jovem atriz, confesso que eu me surpreendi demais com sua atuação e com o personagem em si, que é cheio de camadas e cargas dramáticas, carregada por traumas, medos, inseguranças, tristezas e, acima de tudo, sua esperança em dar um futuro liberto ao seu filho Jack por ter tido o começo da infância desperdiçado e trancado, com isso podemos entrar em um consenso que Brie Larson deu um show de atuação, sua aparência física foi apenas um complemento, ela não usou desse artifício como suporte, os primeiros 40 minutos de filme ela logo te faz se intrigar e se comover, cenas como ela cuidando do Jack, colocando ele pra dormir, uma das cenas mais sensíveis que já vi, como amamentar seu filho de 5 anos ou tomar banho com ele na banheira, foi de uma sensibilidade esplêndida, sua personagem traz marcas irreparáveis, quem não conhece a história do livro, cujo o filme foi baseado, pode pensar que esse filme trata-se apenas de uma mãe que vive com seu filho em um quarto minúsculo e que ambos são privados da experiência de conviver no mundo aberto, mas o que poucos sabem é que sua história é muito mais pesada do que se imagina, ela foi sequestrada aos 17 anos por um homem e hoje vive em um quarto no quintal da casa do sequestrador, o mesmo homem a violentou e, logo, é o pai do Jack.

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Brie Larson simplesmente imerge na sua personagem e toma as dores para si, sua interpretação consegue nos passar a dor e a perda às vezes dos sonhos, esperanças, a perda da inocência pela privatização e violência sofrida. Ela consegue passar o amor de uma mãe, um amor incondicional, um amor capaz de fazê-la negar ou deixar de sonhar seus próprios sonhos pra viver os sonhos do filho. Ela consegue passar dor, medo, tristeza, amor, pânico, depressão, conseguindo mesclar e passear por todas as emoções que você possa imaginar. Brie Larson dá um show nesse filme que trata de um garoto de 5 anos que foi “privado” do mundo, porém mais que isso, é um filme sobre amor, sobre esperança, sobre mudança e sobre redenção. O Quarto de Jack é um filme cujo seu maior objetivo não é ganhar prêmios, emocionar e muito menos entreter, é um filme cujo seu maior objetivo é te tocar.


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O Quarto de Jack (Room, 2015 – 118 min)

Drama

Dirigido por Leny Abrahamson com roteiro de Emma Donoghue. Estrelando: Brie Larson, Jacob Tremblay, Sean Bridgers, Joan Allen, William H. Macy e Tom McCamus.

3 comentários sobre “O Quarto de Jack, sonhos não se prendem em paredes

  1. Excelente post Letícia.

    Existe uma virada no meio do filme que é muito interessante e bem conduzida, é como se até o protagonismo da história se invertesse.

    Adorei a atuação do garoto, muito convincente e emocionante.

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  2. Sem dúvidas é um filme bem interessante, como ele vai desenvolvendo aos poucos como funciona o “universo” dentro do quarto na visão de Jack. É uma história muito tensa contada do ponto de vista da pessoa mais inocente que é a criança. A relação entre mãe e filho, como ele enxerga o mundo e tem dificuldade de entender certas coisas é bem curioso.

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  3. Que resenha fantástica! Quero assinar meu nome embaixo, porque concordo com cada vírgula. De todos os indicados a melhor filme, foi, sem dúvidas, o meu favorito. O que me tocou lá no fundo, me deu vontade de rever, me fez passar dias e dias pensando nele e correr atrás do livro. Espero que, ao menos, a Brie Larson leve esse Oscar pra casa

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